PENTATEUCO KARDEQUIANO

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OBRAS BÁSICAS

quinta-feira, agosto 20, 2015

Os Sábios e a Senhora Piper

Os Sábios e a Senhora Piper
Provas da comunicabilidade dos espíritos

I  -  O “corvo branco” – explicações iniciais
O interesse pela mediunidade de Leonore Piper nos acompanha há quase 15 anos. O forte estímulo que nos moveu a estudar a bibliografia existente sobre a citada médium foi uma conferência que assistimos, nos idos de 1972, de Divaldo Pereira Franco.
Uma das surpresas que tivemos foi encontrarmos esparsas e resumidas referências a Leonore Piper na literatura em língua portuguesa.
À medida que aprofundávamos a leitura, fomos encontrando citações de obras estrangeiras. À distância e com dificuldades passamos a rastreá-las. No entanto, com o tempo, as correspondências, viagens dos tios dr. Lourival Perri Chefaly e Suzi e nossa própria, nos trouxeram às mãos os livros que procurávamos. Em duas oportunidades que nos dirigimos ao exterior, levamos na bagagem das intenções o propósito de encontrar algo relacionado com a sra. Piper e alguns de seus pesquisadores. Andando por Londres, Boston e New York, em visita a locais, sociedades e livrarias, buscamos as almejadas informações.
Agora, ao oferecermos este material sobre a vida e a obra de Leonore Piper, na realidade não estamos criando nada, mas divulgando o resultado de nossos estudos a respeito da famosa médium americana. Não tivemos a pretensão de relacionar tudo o que há sobre ela e nem de transcrever todo o material; nosso propósito é oferecer uma visão abrangente, porém objetiva.
De início, são de muita importância algumas rápidas pinceladas sobre as diferenças sócio-culturais da época e dos países. Além disso, a nosso ver, a mediunidade da sra. Piper não pode ser analisada sob os parâmetros que em geral empregamos na atualidade para aferirmos o valor e a produtividade de nossos médiuns, geralmente vinculados a um contexto doutrinário e institucional muito próprio de nosso país.
Leonore Piper viveu numa época em que o novel Espiritismo mal saía dos limites da França e de seu raio latino de influência. Na Inglaterra e nos Estados Unidos, o “Spiritualism”, que tem como marco inicial os fenômenos de Hydesville e a data de 31 de março de 1848 (36),  oferecia uma certa resistência ao Espiritismo, ou seja, a algumas idéias basilares da obra de Allan Kardec (8). Dessa forma, o Espiritismo era pouco divulgado no mundo anglo-saxônico. Mesmo assim, floresciam grupos “spiritualists”, grupos de pesquisa e os primeiros periódicos. Aliás, estes precederam o lançamento da Revista Espírita de Allan Kardec, pois em 1847 surgia o periódico Univercoelum fundado por Andrew Jackson Davis e A. S. Brittan, nos Estados Unidos. Dois anos depois esse jornal deu lugar ao The Present Age. E em Boston, a cidade em que viveu a médium Piper, em julho de 1850, Leroy Sunderland fundava o Spiritual Philosopher que depois passou a se chamar Spirit World. O historiador Podmore (31) considera Sunderland o primeiro editor no campo do “spiritualism”. Ainda em Boston surgiu o jornal Heat and Lux, em 1851. Assim, nos primeiros 30 anos de Doutrina Espírita (ou 40 anos de “Spiritualism”) surgiram inúmeros órgãos. (5)
Por outro lado, havia uma situação paradoxal em ambos os países de língua inglesa. Ao mesmo tempo em que campeava preconceito aos fenômenos e idéias espiritualistas não atreladas às religiões formais e, dentro do “Spiritualism” o preconceito ao Espiritismo, havia por parte de outros o interesse pela pesquisa dos fenômenos que estavam despertando muita atenção. Outro registro histórico importante é que nos primeiros 20 anos do surgimento do “Spiritualism” a rainha Vitória (da Inglaterra) e o presidente Abraham Lincoln (dos Estados Unidos) estavam entre as pessoas eminentes que tiveram experiência direta com as comunicações espirituais. (36)
A rainha Vitória nomeou uma Comissão de Sábios no ano de 1869 para investigar os fatos. Logo depois, o renomado cientista Sir William Crookes realizava pesquisas com alguns médiuns. No ano de 1882 homens de proeminência cultural e científica fundaram a sociedade para Pesquisas Psíquicas,  em Londres. Essa Sociedade, durante muitos anos, catalisou o esforço de cientistas de vários países para as pesquisas medianímicas e passou a contar com um ramo americano, sediado em Boston.
No final do século XIX Boston se constituía no principal centro literário americano, sendo conhecida como a “Atenas da América”. Entre outros núcleos educacionais já funcionava a todo vapor a tradicional Universidade de Harvard. Essa cidade, que foi uma das pioneiras do campo do “Spiritualism” americano, parece que não possuía um núcleo com a orientação do Espiritismo.
Vivendo dentro dessa atmosfera, a sra. Piper, ao se defrontar com a problemática da mediunidade, manteve-se ligada à sua religião, que era comum nos Estados Unidos. Ela não possuía nenhuma vinculação e nem conhecimento do Espiritismo.
As coincidências que levaram o destacado prof. William James a ser um dos primeiros visitantes da jovem médium Piper abriram os caminhos para as experimentações em torno de sua mediunidade. Com isso, a sra. Piper tornou-se a médium das pesquisas do próprio James e de outros homens notáveis, como o dr. Richard Hodgson, prof. James Harvey Hyslop, Sir Oliver Lodge, Fredrich W. H. Myers, sr. e sra. Henry Sidgwick, prof. Charles Richet e outros. Durante muitos anos ela polarizou a atenção da Society for Psychical Research e de seu ramo americano. Em conseqüência, os feitos mediúnicos dela são citados não apenas por esses que tiveram contato direto com ela, mas também por pesquisadores e escritores ligados ao Espiritismo, como Gabriel Delanne, Léon Denis, Cesare Lombroso, Ernesto Bozzano e outros.
Foram inúmeros os artigos e citações que surgiram na literatura após a publicação do primeiro trabalho sobre a sra. Piper, de autoria de Myers e publicado nos Proceedings of the Society for Psychical Research, em 1890 (35). A coleção dos Proceedings é muito rica de informações sobre as experiências com ela; recorrendo a esse material, Michel Sage publicou em Paris, no ano de 1902, uma obra que resume os principais fatos sobre ela: Madame Piper et la Société Anglo-Américaine pour les Recherches Psychiques, que teve o prefácio de Camille Flammarion.
Dessa maneira, portadora de vários dons e protagonista de feitos mediúnicos notáveis e prestando-se corajosa e, a nosso ver, em caráter missionário, a estudos científicos – no período de 1885 a 1915 – e ainda em períodos curtos na década de 20, temos de concordar com Michel Sage: “esta mediunidade é certamente a que foi mais estudada por tempo mais longo e por homens de alta competência”.
As atividades mediúnicas da sra. Piper serviram para estudos e conclusões científicas importantes, convencendo diversos cientistas e inteligências privilegiadas sobre a imortalidade da alma e a comunicabilidade dos espíritos. Mas, ao mesmo tempo, em suas reuniões e consultas, milhares e milhares de consulentes foram levados a idêntica conclusão.
Reunimos informações diversificadas sobre a médium americana; no entanto, destacamos as publicações da Society for Psychical Research, a obra Expériences d’un Psychiste, de William James, e a obra The Life and Work of Mrs. Piper, escrita pela filha Alta Piper. No conjunto, inter-relacionando as diversas obras, temos uma visão mais global sobre a médium.
O livro escrito pela filha é cativante, onde se sente o amor e a admiração da filha pela mãe devotada e médium dedicada. O trabalho de William James é o relato racional, quase que totalmente baseado nos dons da sra. Piper.
Alta L. Piper contou com o prefácio de Sir Oliver Lodge, que em 1929, à época da publicação, era o pesquisador remanescente do grupo mais ligado à família. No prefácio, o notável físico inglês considera-a a mais famosa médium de nossos dias. Além de afirmar que não há qualquer sorte de dúvida em torno dos dons de Mme. Piper, evoca a existência normal que ela leva junto com suas duas devotadas filhas, caracterizando uma exemplar vida familiar. No início da obra, Alta Piper cita Oliver Lodge: “Não podemos legislar para tais coisas, nosso negócio é entendê-los”, e exalta o papel de sua mãe: “os anais da pesquisa psíquica não contêm registros de qualquer outro médium que tenha sido tão examinado, tão rigorosamente, bem como por tempo tão longo como tem sido investigada a sra. Piper”.
No livro do intelectual americano sentimos sua obstinada busca da verdade, utilizando-se do rigor e da imparcialidade nos comentários e nas conclusões. William James não apenas foi o introdutor da médium no mundo da ciência psíquica, mas também se constituiu o orientador e amigo da sra. Piper. Em 1894, ao assumir a presidência da Society for Psychical Research, de Londres, William James considerou-a seu único “corvo branco”, destituindo-lhe uma série de preconceitos. Essa colocação de seu discurso traduz bem a situação quase que de excepcionalidade que ela gozava no meio científico e também do impacto que seus dons produziram na época.
Julgamos grandioso o desprendimento e a humildade dessa criatura que deixou momentos com a própria família para atender ao chamado dos cientistas. As vigilâncias verdadeiramente policiais, os testes de sensibilidade e as dúvidas que muitos lançaram a priori criaram-lhe situações vexatórias. Ela se submeteu a tudo com altivez e continuou em suas atividades. Todavia, a filha não deixou de registrar em seu livro que alguns pesquisadores também mantiveram um relacionamento atencioso e de amizade com a família, principalmente o prof. William James, dr. Richard Hodgson e Sir Oliver Lodge.
Com relação às pesquisas efetuadas em torno da mediunidade da sra. Piper, elas também se encaixam dentro das condições da época. O método qualitativo foi o adotado. Aliás, foram trabalhos pioneiros da ciência psíquica e contemporâneos aos albores da Metapsíquica. Porém, não se pode olvidar que todos esses estudos e esforços é que acabaram redundando no surgimento da Parapsicologia e na adoção do método quantitativo.
Em nossa ótica, Leonore Piper realmente merece o título de maior médium americana e tem lugar de realce na história dos fenômenos medianímicos e das pesquisas a eles relacionados. Além de tudo isso, a diversidade de seus dons serviram de exemplo para inúmeros tipos de mediunidade e ilações doutrinárias espíritas podem ser tiradas da análise de sua prática mediúnica.
Sem sombra de dúvida, a vida e as atividades de Leonore Piper representam um repositório exponencial para a comprovação da imortalidade e da comunicabilidade dos espíritos.
Araçatuba, janeiro de 1986.
Antonio Cesar Perri de Carvalho
(5)     Carvalho, A.C.P.Primórdios da Imprensa “Espiritualista” e EspíritaReformador, 97 (1808): 347-350, 1979.
(8)     Doyle, A.C.História do Espiritismo (trad. J. Abreu Filho), São Paulo, O Pensamento, 1960, pp. 313-336.
(31)   Podmore, F.Mediums of the 19th Century (vol. 2), New York, University Books, 1963, pp 308-329.
(35)   Sidgwick, H.Discussion of the Trance Phenomena of Mrs. Piper. Proc. Soc. Psych. Res., 15 (36): 16-38, 1900.

(36)   Stemann, R.One Hundred Years of Spiritualism. London, The Spiritualist Association of Great Britain, 1972, p. 16.





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