NO JARDIM DAS OLIVEIRAS
Jesus foi com seus discípulos
para o outro lado da torrente do Cedron.
Havia ali um jardim, onde
Jesus entrou com seus discípulos. (João,
18:1.)
Escavações junto à parte velha de
Jerusalém revelaram o trecho de uma estrada romana, com degraus de pedra, que
descia a encosta oriental do Monte Sião, na direção do Vale do Cedron.
O Cedron é um riacho que passa grande
parte do ano seco. Findo o período chuvoso, em março, ele toma a aparência de
torrente, ou seja, um curso de água formado por enxurradas.
Adiante do Cedron, eleva-se o monte que no
passado era um bosque de oliveiras. No começo de sua encosta, havia uma granja
chamada Getsêmani e, nela, um jardim.
Gethsemani ou gethsemanei vem do aramaico
significa lagar das olivas ou de azeite, isto é, tanque ou prensa
onde se espremem azeitonas; moinho de óleo.
Jesus e os apóstolos desceram a estrada
romana em direção ao Getsêmani.
Era por volta das 22 horas, mas não havia
escuridão, porque era tempo da Páscoa e, portanto, de lua cheia. Lá chegando,
Jesus disse aos onze: — “Sentai-vos aí enquanto vou até ali para orar”.
(Mateus, 26:36.)
Pedro, João e Tiago foram com Ele.
Mateus, 26:37 descreve o estado emocional
de Jesus a partir daí: “começou a entristecer-se e a angustiar-se”. Marcos,
14:33 foi mais longe: “começou a apavorar-se e a angustiar-se”. A tradução de
João Ferreira de Almeida e a Tradução Ecumênica da Bíblia preferem “pavor”:
“começou a sentir-se tomado de pavor e angústia”.
Haroldo Dutra Dias (NOVO (O), 2013, p.
232) informa o sentido literal da palavra grega empregada por Marcos:
“surpreender-se (positiva ou negativamente), pasmar-se, ficar atônito”, razão
pela qual adotou: “ começou a ficar atônito e a angustiar-se”. (Marcos, 14:33.)
Então, Jesus falou aos três: — “Minha
alma está triste até a morte. Permanecei aqui e vigiai comigo”. (Marcos,
14:34.)
Existia
ali uma gruta que Jesus e os apóstolos costumavam frequentar.
Nela
estava instalada uma prensa para olivas. O lugar deveria ser propriedade de
algum seguidor de Jesus, pois os primeiros cristãos visitavam-no constantemente
e, já nos primeiros séculos, foi erguida sobre ele uma igreja rupestre, a Basílica
da Agonia.
Caminhando
um pouco à frente dos três, Jesus entrou na gruta, que media naquela época cerca
de 13 metros por 8 metros. Lucas, 22:41 e 42 informa que Ele se afastou dos três
à distância de “um tiro de pedra”, quer dizer, o suficiente para ser visto e
ouvido.
A sós, Ele
se prostrou com o rosto no chão e orou: — “Meu
pai, se é possível, que passe de mim este cálice; contudo, que não seja como eu
quero, mas como tu queres”.
Lucas,
22:43 acrescenta, neste ponto, que um Espírito angélico lhe apareceu para
confortá-lo.
Passagens
como essa demonstram que os evangelhos são mais que simples discursos em louvor
a Jesus. É lógico perguntar quem descreveu a passagem, se as testemunhas
dormiam. Lógico também considerar que os evangelistas não teriam interesse em
inventá-la, por seu conteúdo aparentemente embaraçoso, pois muitos intérpretes
supõem por ela que Jesus sofreu o tormento do medo, reagindo qual homem comum.
Outros intérpretes,
como Mario Galizzi (in GHIBERTI, 1986, p. 645), entreviram no episódio
algo diverso do medo: Ele não é
um homem amedrontado. Sente tristeza e angústia, mas tem pleno controle sobre
si mesmo e se esforça para não interromper a comunhão que se havia estabelecido
entre ele e os discípulos durante a Última Ceia.
Amélia Rodrigues
(FRANCO, 1991a, p. 134) salientou, por sua vez: “A agonia, a dor produzida pela
ingratidão dos comensais do Seu amor feriam-n’O fundamente e Ele buscava o abismo
do Pai”.
Depois da oração,
Jesus retornou ao lugar onde estavam os três apóstolos, mas os surpreendeu
dormindo. E disse a Pedro: — “Como assim? Não fostes capazes de vigiar comigo
por uma hora!”
Há pouco, Ele lhes
tinha dito no cenáculo: — “Vós sois os que permanecestes constantemente comigo
em minhas tentações”. (Lucas, 22:28.)
Agora
dormiam. — “Vigiai
e orai, para que não entreis em tentação, pois o espírito está pronto, mas a
carne é fraca”. (Mateus, 26:41.)
Outra vez
Jesus se retirou para orar:
Ele
adverte, constatando o perigo que ronda os apóstolos.
— “Meu
Pai, se não é possível que isto passe sem que eu o beba, seja feita a tua
vontade!” (Mateus, 26:42.)
Novamente
encontrou os três em sono pesado. E eles não sabiam como explicar, sobretudo porque
Jesus lhes pedira: “Vigiai e orai”.
Jesus
ainda entrou na gruta uma terceira vez e repetiu a mesma prece.
Reaproximando-se
dos apóstolos entorpecidos pela estranha fadiga e sonolência, recomendou: — “Dormi
agora e repousai; eis que a hora está chegando, e o Filho do Homem está sendo
entregue às mãos dos pecadores”. (Mateus, 26:45.)
E por fim: — “Levantai-vos!
Vamos! Eis que meu traidor está chegando”. (Mateus, 26:46.)
Entende-se
a palavra agonia quase sempre como sinônima de aflição e sofrimento.
Entretanto, ela significa também “combate”. (DUQUESNE, 2005, p. 231.) Aquele
era um momento de grande tensão e combate. O êxito da missão de Jesus estava
sob ataque cerrado. Falanges da espiritualidade inferior, sem poderem
atingi-lo, diretamente, irromperam vigorosa ação obsessiva sobre as autoridades
humanas e os apóstolos. Jesus deveria ser morto, e seus seguidores deveriam
esquecê-lo, como se acordassem,
após sua
morte, de um pesadelo, que o tempo varreria de suas consciências e, portanto,
das páginas da história, tornando inócua sua passagem entre os homens.
Sua agonia
não retrata a fragilidade de Jesus, como querem uns, mas seu combate espiritual
com forças muito além da compreensão humana.
Os germens de grandes
lutas da humanidade futura estavam sendo soprados venenosamente, para
contaminar os séculos com guerras fraticidas e ódios asselvajados entre indivíduos
e povos.
Ele não quedou
perante a antevisão do sacrifício da cruz a levantá-lo, mas sofreu e lutou
espiritualmente para que se amenizassem as consequências sinistras do maior
conflito espiritual que a Terra já viveu.
Por isso, o Profeta
do Amor ardentemente intercedeu junto a Deus em favor dos homens, rogando que
aquele cálice de presciência fosse afastado de seus lábios.
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