Jorge Hessen
jorgehessen@gmail.com
Raciocinemos sobre o tal Carnaval, um termo oriundo de uma festa
romana e egípcia em homenagem ao Deus Saturno, quando carros alegóricos (a
cavalo) desfilavam com homens e mulheres. Eram os carrum navalis, daí a origem
da palavra “carnaval”. Há quem interprete a palavra conforme as primeiras
sílabas das palavras da frase: carne nada vale. Como festa popular, poderia ser
um acontecimento cultural plausível, não fossem os excessos cometidos em nome
da alegria.
Nesses períodos os carnavalescos alucinados surgem de todos os
(re)cantos para caça da contraversão da ética. Para muitos são longas as
estações de dias e noites para as preparações do delírio insano dos três dias
de fantasias. Vários incautos esfolam as finanças familiares para experimentar
o encanto efêmero de curtir dias de completa paranoia. Adolescentes e marmanjos
se abandonam nas arapucas pegajosas das drogas lícitas e ílícitas. Não
compreendem que bandos de malfeitores do além (obsessores) igualmente colonizam
as avenidas das escolas de samba num lúgubre show de bizarrices. Celerados das
escuridões espirituais se acoplam aos bobalhões fantasiados pelos condutores
invisíveis do pensamento, em face dos entulhos concupiscentes que trazem no
mundo íntimo.
Sobrevém uma permuta vibratória em todos e em tudo. Os espíritos das
brumas umbralinas se conectam aos escravos de momo descuidados, desvirtuando-os
a devassidões deprimentes e jeitos grotescos de deploráveis implicações morais.
Tramas tétricas são armadas no além-tumba e levadas a efeito nessas oportunidades
em que momo impera dominador sobre as pessoas que se consentem despenhar na
festa medonha.
Enquanto olhos embaciados dos foliões abrangem o fulgor dos refletores
e das fantasias brilhantes (inspirações ridículas impostas pelos malfeitores
habitantes das províncias lamacentas do além túmulo), nas avenidas onde
percorrem carros alegóricos (que, pasmem! já até transportou a efígie do Chico
Xavier sob aplausos de omissos líderes espíritas), a visão dos espíritos
observa o recinto espiritual envolto em carregadas e sombrias nuvens cunhadas
pelas oscilações de baixo teor mental.
Os três dias de folia, assim, poderão se transformar em três séculos
de penosas reparações. É bom pensarmos um pouco nisso: o que o carnaval traz ao
nosso Espírito? Alegria? Divertimento? Cultura? É de se perguntar: será que
vale a pena pagar preço tão elevado por uns dias de desvario grupal?
Quando se pretende alcançar essa alegria, através do prazer desregrado
e dos excessos de toda ordem, o resultado é a insatisfação íntima, o vazio
interior provocado pelo desequilíbrio moral e espiritual. Portanto, não fossem
os exageros, o Carnaval, como festa de integração sócio-racial, poderia se
tornar um acontecimento compreensível, até porque não admitir isso é incorrer
em erro de intolerância. Porém, para os espíritas merece reflexão a advertência
de André Luiz: “Afastar-se de festas lamentáveis, como aquelas que assinalam a
passagem do carnaval, inclusive as que se destaquem pelos excessos de gula,
desregramento ou manifestações exteriores espetaculares. A verdadeira alegria
não foge da temperança.” (1)
A efervescência momesca é episódio que satura, em si, a carga da
barbárie e do primitivismo que ainda reina entre nós, os encarnados,
distinguidos pelas paixões do prazer violento. Costuma ser chamado de folia,
que vem do francês folle, que significa loucura ou extravagância. Nos dias
conturbados de hoje, sabe-se que “(…) de cada dez casais que caem juntos na
folia, sete terminam a noite brigados (cenas de ciúme etc); que, desses mesmos
dez casais, posteriormente, seis se transformam em adultério, cabendo uma média
de três para os homens e três para as mulheres (por exemplo); que, de cada dez
pessoas (homens e mulheres) no carnaval, pelo menos sete se submetem
espontaneamente a coisas que normalmente abominam no seu dia a dia, como
álcool, entorpecente etc. Dizem, ainda, que tudo isso decorre do êxtase
atingido na Grande Festa, quando o símbolo da liberdade, da igualdade, mas,
também, da orgia e depravação, somadas ao abuso do álcool, levam as pessoas a
se comportarem fora do seu normal (…)” (2)
O Espírito Emmanuel adverte: “Ao lado dos mascarados da
pseudo-alegria, passam os leprosos, os cegos, as crianças abandonadas, as mães
aflitas e sofredoras. (…) Enquanto há miseráveis que estendem as mãos súplices,
cheios de necessidades e de fome, sobram as fartas contribuições para que os
salões se enfeitem.”(3)
Como proferi supra, nesse panorama, os obsessores “influenciam os
incautos que se deixam arrastar pelas paixões de Momo, impelindo-os a excessos
lamentáveis, comuns por essa época do ano, e através dos quais eles próprios,
os Espíritos, se locupletam de todos os gozos e desmandos materiais,
valendo-se, para tanto, das vibrações viciadas e contaminadas de impurezas dos
mesmos adeptos de Momo, aos quais se agarram.” (4)
Portanto, além da companhia de encarnados, vincula-se a nós uma
inumerável legião de seres invisíveis, recebendo deles boas e más influências a
depender da faixa de sintonia em que nos encontremos. As tendências ao
transtorno comportamental de cada um, e a correspondente impotência ou apatia
em vencê-las, são qual imã que atrai os espíritos desequilibrados e
fomentadores do descaso à dignidade humana, que, em suma, não existiriam se
vivêssemos no firme propósito de educar as paixões instintivas que nos
animalizam.
Será racional fechar as portas dos centros espíritas nos dias de
Carnaval, ou mudar o procedimento das reuniões? Existem alguns centros que
fecham suas portas nos feriados do carnaval por vários motivos não razoáveis.
Repensemos: uma pessoa com necessidades imediatas de atendimento fraterno, ou
dos recursos espirituais urgentes em caso de obsessão, seria fraterno fazê-la
esperar para ser atendida após as “cinzas”, uma vez ocorrendo essa infelicidade
em dia de feriado momesco?
Os foliões crônicos declaram que o carnaval é um extravasador de
tensões, “liberando as energias”… Entretanto, no carnaval não são serenadas as
taxas de agressividade e as neuroses. O que se observa é um somatório da
bestialidade urbana e de desventura doméstica. Aparecem após os funestos três
dias as gravidezes indesejadas e a consequente proliferação de assassinatos de
intrusos bebês nos ventres, incidem acidentes automobilísticos, ampliação da
criminalidade, estupros, suicídios, aumento do consumo de várias substâncias
estupefacientes e de alcoólicos, assim como o aparecimento de novos viciados,
dispersão das moléstias sexualmente transmissíveis (inclusive a AIDS) e as
chagas morais, assinalando, densamente, certas almas desavisadas e imprevidentes.
O carnaval edifica o nosso Espírito? Muitos espíritas, ingenuamente,
julgam que a participação nas festas de Carnaval, tão do agrado dos
brasileiros, nenhum mal acarreta à nossa integridade fisiopsicoespiritual. No
entanto, por detrás da aparente alegria e transitória felicidade, revela-se o
verdadeiro atraso espiritual em que ainda vivemos pela explosão de animalidade
que ainda impera em nosso ser. É importante lembrá-los de que há muitas outras
formas de diversão, recreação ou entretenimento disponíveis ao homem
contemporâneo, alguns verdadeiros meios de alegria salutar e aprimoramento
(individual e coletivo), para nossa escolha.
Não vemos, por fim, outro caminho que não seja o da “abstinência
sincera dos folguedos”, do controle das sensações e dos instintos, da
canalização das energias, empregando o tempo de feriado do carnaval para a
descoberta de si mesmo; o entrosamento com os familiares, o aprendizado através
de livros e filmes instrutivos ou pela frequência a reuniões espíritas, eventos
educacionais, culturais ou mesmo o descanso, já que o ritmo frenético do dia a
dia exige, cada vez mais, preparo e estrutura físico-psicológica para os
embates pela sobrevivência.
Somente poderemos garantir a vitória do Espírito sobre a matéria se
fortalecermos a nossa fé, renovando-nos mentalmente, praticando o bem nos
moldes dos códigos evangélicos, propostos por Jesus Cristo.
Referências bibliográficas:
(1) Vieira, Waldo. Conduta
Espírita, ditado pelo Espirito André Luiz, Rio de Janeiro: Ed FEB, 2001, cap.37
“Perante As Fórmulas Sociais”
(2) São José Carlos
Augusto. Carnaval: Grande Festa…De enganos! , Artigo publicado na Revista
Reformador/FEB-Fev 1983
(3) Xavier , Francisco
Cândido. Sobre o Carnaval, mensagem ditada pelo Espírito Emmanuel, fonte:
Revista Reformador, Publicação da FEB fevereiro/1987
(4) Pereira, Ivone.
Devassando o Invisível, Rio de Janeiro: cap. V, edição da FEB, 1998
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