Quando interrogamos
os Espíritos sobre a natureza do perispírito, eles nos respondem que este é
tirado do fluido universal do planeta que habitamos. À primeira vista parece
que isto pouca coisa nos adianta, mas estudando a fundo o assunto, vamos ver
que eles estão certos.
Os
Espíritos entendem por fluido universal uma matéria primitiva, da qual provêm
todos os corpos por transformações sucessivas. Para que se justifique esta
concepção, é preciso demonstrar, 1:, que a matéria pode existir em estados
diferentes, simplificando-se sem cessar até o estado inicial; 2:, que a
infinita variedade dos corpos pode ser reconduzida a uma única matéria.
Estabelecidas
cientificamente estas proposições, a existência do fluido universal não será
mais contestável. A primeira pergunta a fazer-se é a seguinte:
Há fluidos?
É quase
impossível duvidar, depois das experiências de Crookes e dos fatos já narrados,
mas que se deverá entender por esta expressão? Em física, fluidos são os corpos
líquidos e gasosos, mas aqui devemos dar a esta palavra uma significação
especial, que é útil bem definir.
Chamamos
fluidos aos estados da matéria em que ela é mais rarefeita do que no estado
conhecido sob o nome de gás. É
justificada essa concepção?
Para
responder, escutemos Faraday. Eis como ele se expressava em 1816:
Se
imaginarmos um estado da matéria tão afastado do estado gasoso, quanto é este
do estado líquido, tendo em conta, bem entendido, o acréscimo de diferença que
se produz à medida que o grau da mudança se eleva, poderemos, talvez, desde que
nossa imaginação chegue até aí, conceber mais ou menos a matéria radiante; e,
assim, como ao passar do estado líquido ao gasoso, a matéria perde grande
número de suas qualidades, mais ainda deve perder nesta última transformação.
Esta arrojada concepção foi desenvolvida pelo grande físico nos anos
seguintes e pode-se ler, nas suas cartas, compiladas por Bence Jones, este
trecho: Posso assinalar aqui uma progressão notável nas propriedades
físicas que acompanham as mudanças de estado; talvez ela baste para levar os
espíritos inventivos e ousados a acrescentar o estado radiante aos outros
estados da matéria já conhecidos.
À medida que nos elevamos do estado sólido ao
líquido e deste ao gasoso, vemos diminuir o número e a variedade das
propriedades físicas dos corpos; cada estado apresenta menos algumas que o
precedente. Quando os sólidos se transformam em líquidos, todas as graduações
de rijeza e moleza cessam necessariamente de existir; todas as formas
cristalinas ou outras desaparecem. A opacidade ou a cor são substituídas,
muitas vezes, por uma transparência incolor, e as moléculas adquirem, por assim
dizer, uma mobilidade completa.
Se
considerarmos o estado gasoso, vemos aniquilados grande número de caracteres
evidentes dos corpos. As imensas diferenças que existem entre seus pesos
desaparecem quase inteiramente. Apagam-se os traços das diferentes cores que
tinham. Desde então todos os corpos ficam transparentes e elásticos. Eles não
formam mais que um mesmo gênero de substâncias, e as diferenças de rijeza,
opacidade, cor, elasticidade e forma, que tomam quase infinito o número dos
sólidos e dos líquidos, são desde então substituídas por fracas variações de
peso e alguns matizes sem importância.
Assim, para
os que admitem o estado radiante da matéria, a simplicidade dos problemas que
caracterizam esse estado, longe de ser uma dificuldade, é antes um argumento em
favor de sua existência.
Verificaram
até agora um desaparecimento gradual das propriedades da matéria, à medida que
esta se eleva na escala das formas, e ficariam surpresos se esse efeito parasse no estado gasoso. Viram a Natureza fazer os maiores esforços
para simplificar-se em cada mudança de estado, e pensam que, na passagem do
estado gasoso ao radiante, esse esforço deve ser mais considerável.
O que era
hipótese para Faraday é certeza para nós. Crookes, demonstrando a existência da
matéria radiante, pôs fora de dúvida a existência dos fluidos. Os corpos, com
efeito, não mudam bruscamente de estado, não passam instantaneamente do sólido
para o líquido; a maior parte ocupa uma posição intermediária, chamada estado
pastoso. Da mesma maneira, os líquidos não se transformam em gás, sem que seja
possível apreciar as gradações que separam esses dois estados. Os vapores são
disso um exemplo. Mas a diferença entre líquidos e gases é ainda diminuída
pelas experiências feitas por Charles Andrew, o qual mostrou que, em certos
corpos, há mistura de estado líquido e gasoso, de maneira a não se poder
distinguir se o corpo pertence a um ou ao outro estado.
A lei de
analogia nos leva, pois, a admitir que entre os gases e o estado radiante
existe matéria em diferentes estados de rarefação, desde os mais grosseiros,
que se aproximam dos gases, aos mais puros que estão no estado radiante.
Se
mostrarmos que as propriedades químicas seguem a mesma ordem de progressão
decrescente, à medida que se sobe na escala das famílias químicas, dizendo de
outro modo, se fizermos ver que pode supor-se que não existe senão uma só
matéria, da qual derivam todos os corpos que conhecemos, por transformações
sucessivas, estaremos bem perto de tocar o fluido universal de que nos falam
os Espíritos. Vejamos se a unidade de matéria é uma ideia aceitável.
O sábio
químico Wurtz escreveu na Teoria Atômica: A ideia da unidade de matéria é renovada,
proveniente de Descartes, porquanto é uma verdade que, quando se trata do
eterno e insolúvel problema da matéria, o espírito humano parece girar dentro
de um círculo, perpetuando-se as mesmas ideias através dos tempos e
apresentando-se sob formas rejuvenescidas às inteligências de elite que têm
procurado sondar este problema.
Mas não
existe uma certa diferença na maneira de operar desses grandes espíritos? Sem
dúvida alguma. Uns, mais vigorosos talvez, mas mais aventureiros procederam por
intuição; outros, melhor armados e mais severos, por indução racional. Aí está
a superioridade dos métodos modernos, e seria injusto pretender que os esforços
consideráveis, de que temos sido as testemunhas comovidas, não tenham impelido
mais para frente o espírito humano no problema árduo de que se trata, como não
o puderam fazer um Luciécio e um Descartes.
Muitos sábios modernos foram levados, por
suas pesquisas, à conclusão de que se deve admitir a unidade da matéria.
Examinando, com efeito, as relações que existem entre as diferentes famílias
químicas dos corpos, seremos obrigados a aplicar-lhes, por analogia, as mesmas
leis transformistas das famílias naturais dos animais. É que temos, em nossa
época, uma invencível tendência para a síntese e para a simplificação. Tanto
quanto os antigos multiplicavam as causas nós temos hoje o cuidado de
eliminá-las. Mas não basta supor, é
preciso ter provas.
Uma das mais fortes que se
podem fornecer é a que se chama, em química, estados alotrópicos. Certas
substancia podem ter propriedades inteiramente diferentes, sem mudar de
natureza quimicamente falando. Assim, o fósforo pode apresentar aspecto
vermelho, branco ou preto, conforme a maneira de prepará-lo. O que há de mais
notável é que o fósforo vermelho e o fósforo ordinário apresentam tais
diferenças, que seríamos tentados a considerá-los distintos; analisados,
entretanto, pelos mais precisos métodos, não apresentam diferença alguma: são
sempre fósforo.
A transformação se opera expondo-se no vazio barométrico o fósforo
branco à ação dos raios do Sol; cremos que nenhum caso melhor demonstraria que
as propriedades dos corpos são devidas apenas ao arranjo dos átomos que os
estruturam.
O ozônio é também uma
modificação alotrópica do oxigênio. O carbono mostra tão múltiplos aspectos,
propriedades tão diferentes nos alotrópicos que forma, que só é reconhecido
pela sua infusibilidade e pela propriedade de produzir ácido carbônico,
queimando no oxigênio. Ele se apresenta, a princípio, cristalizado, é o
diamante; depois sob a forma de grafite, antracite, coque, pó de sapato,
carvão... Todos esses corpos têm composição idêntica, mas apresentam
propriedades diferentes, segundo o modo de reunião de seus átomos. Somos, pois,
induzidos a crer que só existe uma única matéria, revestindo, entretanto,
aspectos diferentes. Eis uma observação que demonstra estarmos com a verdade.
Tratando da análise
espectral, Zoborowski refere as seguintes experiências: Com o fim de determinar
as temperaturas das diversas partes do Sol, tomaram-se fotografias dos
espectros dessas diferentes partes. Cada corpo em combustão assinala, como se
sabe, sua presença, na luz decomposta em seus elementos ou espectral, por raias
particulares. Demonstrou-se que o alargamento das raias da platina é
correlativo à elevação da temperatura. Foi, assim, possível tirarem-se, com
proveito, fotografias dos espectros de grande número de estrelas. E, de
conformidade com a hipótese de Laplace, verificou-se que estes astros estão em
diferentes estados de condensação. As estrelas brancas, mais ardentes, contêm hidrogênio
em abundância e em alta pressão; as estrelas brilhantes se aproximam da
constituição do nosso Sol; as estrelas avermelhadas são muito menos quentes.
Apagando-se, passam ao estado dos planetas obscuros. Nasceram das nebulosas. É
pelo menos a grande hipótese clássica desde Laplace. Esta hipótese, porém, só
será verificável porque a fotografia, permitindo que se apanhem e conservem as
imagens das nebulosas em diversas épocas, através dos séculos, dar-nos-á os
meios de seguir as transformações destas matérias cósmicas, espécie de
protoplasma que gera os mundos.
Com um fim um pouco
diferente Lockyer (1879) e Huggins (1882) fotografaram os espectros de uma
série de nebulosas, das mais densas às mais rarefeitas; chegaram a reconhecer
que o número dos corpos simples diminui à medida que se passa das primeiras às
segundas. Os espectros fotográficos dos mais rarefeitos só revelam hidrogênio
e fósforo.
É
verdadeiramente a confirmação das vistas expostas mais acima sobre a unidade da
matéria. A correlação assinalada por Faraday, entre o estado cada vez mais rarefeito
da matéria e a perda conexa das principais propriedades que a caracterizavam,
dá-nos o direito de dizer que existe um estado radiante da matéria que forma o
fluido universal. É desse meio que é tirado o perispírito.
Isto posto,
procuremos ver o que se passa numa materialização. Para tal é preciso bem
saber o que é a própria matéria e a que agente são devidas suas propriedades.
Todos os
corpos são compostos de partes infinitamente pequenas, chamadas átomos; para
se ter uma ideia de sua tenuidade, tomemos uma substância corante e constataremos que ela pode tingir vários
milhões de vezes seu volume de água, isto é, que as moléculas que constituem
este corpo, se espalharam na massa total do líquido, dividindo-se cada vez
mais. Em vista disso poder-se-ia crer que os corpos são indefinidamente
divisíveis, o que seria um erro, porque a lei das proporções definidas é um
argumento sem réplica que se pode invocar em favor de uma divisibilidade
limitada. Estes átomos que estruturam todos os corpos não se tocam; são colocados
uns ao lado dos outros, e agrupados por uma força chamada coesão; todos os
corpos da natureza nos aparecem, pois, como coleções de átomos ou de moléculas
reunidas diversamente, daí tenderem as novas concepções científicas a
considerar os fenômenos como movimentos moleculares ou de transporte no
espaço.
A matéria é
inerte, incapaz de por si mesma entrar em movimento; quando se verifica um
deslocamento num corpo, houve uma força que o fez sair do estado de inércia.
Pode-se dizer, portanto, que o movimento é a expressão da força, mas esta força
pode agir de diferentes maneiras, quer deslocando o corpo no espaço, quer
determinando mudanças em seu estado molecular. Por exemplo, se com o dedo
mantém-se uma corda de violino afastada da sua posição de repouso, as moléculas
que formam esta corda tendem a retomar sua primeira posição, exercem uma pressão
sobre o dedo, há, pois, trabalho molecular interno; se, ao contrário, retira-se
o dedo, a corda põe-se em movimento e o trabalho molecular que produzia a
pressão se converte em movimentos de transporte que se executam de um lado e de
outro da posição de repouso da corda; o vaivém se amortece progressivamente
pela resistência do ar e dos pontos pelos quais as cordas se prendem ao
violino.
Esta teoria
estabelece, em princípio, que as qualidades dos corpos são devidas aos
movimentos particulares de que são animados os átomos ou as moléculas de cada
substância. As propriedades químicas seriam devidas a agrupamentos diferentes
de átomos; sem dúvida não se pode supor atualmente a que espécie de movimentos
constitutivos é devida, por exemplo, a
diferença entre o ouro e a prata, mas a ideia de que é nestes movimentos que
ela reside, nem por isso é hoje menos universalmente aceita.
Não se apregoe que esta
teoria seja forjada para as necessidades de nossa causa; depois do
descobrimento da transformação e da conservação da força, é a única que se pode
compreender, e se a encontrará exposta na psicofísica do professor Delboeuf.
Se esta concepção moderna é
verdadeira, o Universo apareceria à nossa inteligência, suposta perfeita, como
sendo composto de grupos diferentes de átomos, grupos moveis no espaço, enquanto
todos os átomos oscilam em torno de um centro de equilíbrio; as variedades
proviriam de agrupamentos diferentes, ou do sentido da amplidão e da rapidez
das vibrações dos átomos.
Tudo é movimento. Do átomo invisível ao corpo
celeste perdido no espaço, tudo é submetido ao movimento, tudo gravita em uma
órbita imensa ou infinitamente pequena. Mantidas a uma distância definida,
umas das outras, em razão mesma do movimento que as anima, as moléculas
apresentam relações constantes que só perdem pela aquisição ou subtração de
certa quantidade de movimento. Segundo a rapidez das vibrações dos átomos as
substâncias serão em estado sólido, líquido, gasoso ou radiante.
Para fazer um corpo passar
por esses diferentes estados, empregamos com maior frequência o calor, que não
é senão um estado vibratório do éter, mas não sabemos se outros agentes têm o
mesmo poder, isto é, não podem fazer passar as diferentes substâncias pelos
estados sólido, líquido e gasoso.
Os Espíritos nos ensinaram
que a vontade é uma força considerável, por meio da qual eles agem sobre os
fluidos; é pois, a vontade que determina
as combinações dos fluidos; eles podem, por sua ação, fazer todas as
manipulações fluídicas que lhes aprouver, mas para materializar essas criações
fluídicas eles têm necessidade de um agente essencial: o fluido vital. Só o
encontram, capaz de preencher as condições necessárias para a materialização,
no organismo humano, donde a presença indispensável de um médium.
Conhecido isto, como
conceber que um Espírito possa primeiro mostrar-se-nos e, em seguida,
materializar-se?
Para que o Espírito se mostre é preciso que ele extraia o fluido vital
do organismo do encamado. Por meio desse agente, ele produz em seu envoltório uma alteração
molecular que de translúcido o torna opaco. Encontra-se um efeito análogo, posto
que inverso, quando se estudam as propriedades de certas substâncias, como o
hidrofânio, rocha silicosa opaca, que se torna transparente, quando mergulhada
na água. Dá-se o mesmo com uma folha de papel untada dum corpo gorduroso. A
opacidade é devida à reflexão da luz sobre as diferentes parcelas do papel; mas
a interposição de uma substância que impeça a reflexão, permite a luz
atravessar o corpo e, por consequência, produz-se a transparência.
Efeito inverso se nota com
os Espíritos. Aliás, basta examinar a condensação de um vapor num tubo, para
compreender-se como pode o perispírito, sob a influência da vontade e do
fluido vital, materializar-se.
O invólucro fluídico que
reproduz, geralmente, a aparência física que o Espírito tinha em sua última
encarnação, possui todos os órgãos do homem, de sorte que, diminuindo o
movimento molecular radiante desse invólucro, ele aparece, a princípio, sob um aspecto vaporoso, como no
caso da inspetora de Riga; depois o fluido vital do médium se vai acumulando no
corpo fluídico, e lhe comunica, momentaneamente, uma vida fictícia, que é tanto
mais intensa quando maior quantidade de fluido despende o médium. É esta a
razão por que os médiuns de materialização ficam mergulhados em catalepsia.
Pôde-se observar, nos casos
narrados de desdobramento, que não parecia necessária à presença de um médium.
É que o próprio encamado fornecia o fluido vital indispensável, ele era seu
próprio médium, e seu duplo tinha uma realidade mais ou menos tangível,
conforme a sua abundância de fluidos.
Circunstância que parece
estranha é a desaparição súbita do espírito materializado. Dir-se-ia que o
perispírito, que se materializou lentamente, deve repassar por fases inversas
para voltar ao estado fluídico. Isto, porém, se compreende, sabendo-se que a
água, mesmo em estado sólido, tem certa tensão de vapor. Não é raro ver-se o
gelo desaparecer, sem ter passado pela fusão; ele passa bruscamente ao estado
de vapor, e, neste caso, devemos admitir, o que já reconhecia o naturalista
Plínio, que houve vaporização imediata.
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