PENTATEUCO KARDEQUIANO

PENTATEUCO  KARDEQUIANO
OBRAS BÁSICAS

segunda-feira, outubro 23, 2017

O ESPIRITISMO PERANTE A CIÊNCIA - GABRIEL DELANNE

O  ESPIRITISMO  PERANTE  A  CIÊNCIA
GABRIEL   DELANNE (* 23 MAR 1827   +  15 FEV 1926)
ENSAIO   DE   TEORIA
Quando interrogamos os Espíritos sobre a natureza do perispírito, eles nos respondem que este é tirado do fluido universal do planeta que habitamos. À primeira vista parece que isto pouca coisa nos adianta, mas estudando a fundo o assunto, vamos ver que eles estão certos.
Os Espíritos entendem por fluido universal uma maté­ria primitiva, da qual provêm todos os corpos por transfor­mações sucessivas. Para que se justifique esta concepção, é preciso demonstrar, 1:, que a matéria pode existir em estados diferentes, simplificando-se sem cessar até o estado inicial; 2:, que a infinita variedade dos corpos pode ser reconduzida a uma única matéria.
Estabelecidas cientificamente estas proposições, a existência do fluido universal não será mais contestável. A primeira pergunta a fazer-se é a seguinte:
Há fluidos?
É quase impossível duvidar, depois das experiências de Crookes e dos fatos já narrados, mas que se deverá entender por esta expressão? Em física, fluidos são os corpos líquidos e gasosos, mas aqui devemos dar a esta palavra uma significação especial, que é útil bem definir.
Chamamos fluidos aos estados da matéria em que ela é mais rarefeita do que no estado conhecido sob o nome de gás. É justificada essa concepção?
Para responder, escutemos Faraday. Eis como ele se expressava em 1816:
Se imaginarmos um estado da matéria tão afastado do estado gasoso, quanto é este do estado líquido, tendo em conta, bem entendido, o acréscimo de diferença que se produz à medida que o grau da mudança se eleva, poderemos, talvez, desde que nossa imaginação chegue até aí, conceber mais ou menos a matéria radiante; e, assim, como ao passar do estado líquido ao gasoso, a matéria perde grande número de suas qualidades, mais ainda deve perder nesta última transformação.
Esta arrojada concepção foi desenvolvida pelo grande físico nos anos seguintes e pode-se ler, nas suas cartas, compiladas por Bence Jones, este trecho: Posso assinalar aqui uma progressão notável nas propriedades físicas que acompanham as mudanças de estado; talvez ela baste para levar os espíritos inventivos e ousados a acrescentar o estado radiante aos outros estados da matéria já conhecidos.
À  medida que nos elevamos do estado sólido ao líquido e deste ao gasoso, vemos diminuir o número e a variedade das propriedades físicas dos corpos; cada estado apresenta menos algumas que o precedente. Quando os sólidos se transformam em líquidos, todas as graduações de rijeza e moleza cessam necessariamente de existir; todas as formas cristalinas ou outras desaparecem. A opacidade ou a cor são substituídas, muitas vezes, por uma transparência incolor, e as moléculas adquirem, por assim dizer, uma mobilidade completa.
Se considerarmos o estado gasoso, vemos aniquilados grande número de caracteres evidentes dos corpos. As imensas diferenças que existem entre seus pesos desaparecem quase inteiramente. Apagam-se os traços das diferentes cores que tinham. Desde então todos os corpos ficam transparentes e elásticos. Eles não formam mais que um mesmo gênero de substâncias, e as diferenças de rijeza, opacidade, cor, elasticidade e forma, que tomam quase infinito o número dos sólidos e dos líquidos, são desde então substituídas por fracas variações de peso e alguns matizes sem importância.
Assim, para os que admitem o estado radiante da matéria, a simplici­dade dos problemas que caracterizam esse estado, longe de ser uma dificuldade, é antes um argumento em favor de sua existência.
Verificaram até agora um desaparecimento gradual das propriedades da matéria, à medida que esta se eleva na escala das formas, e ficariam surpresos se esse efeito parasse no estado gasoso. Viram a Natureza fazer os maiores esforços para simplificar-se em cada mudança de estado, e pensam que, na passagem do estado gasoso ao radiante, esse esforço deve ser mais considerável.
O que era hipótese para Faraday é certeza para nós. Crookes, demonstrando a existência da matéria radiante, pôs fora de dúvida a existência dos fluidos. Os corpos, com efeito, não mudam bruscamente de estado, não passam instantaneamente do sólido para o líquido; a maior parte ocupa uma posição intermediária, chamada estado pastoso. Da mesma maneira, os líquidos não se transformam em gás, sem que seja possível apreciar as gradações que sepa­ram esses dois estados. Os vapores são disso um exemplo. Mas a diferença entre líquidos e gases é ainda diminuída pelas experiências feitas por Charles Andrew, o qual mos­trou que, em certos corpos, há mistura de estado líquido e gasoso, de maneira a não se poder distinguir se o corpo pertence a um ou ao outro estado.
A lei de analogia nos leva, pois, a admitir que entre os gases e o estado radiante existe matéria em diferentes estados de rarefação, desde os mais grosseiros, que se aproximam dos gases, aos mais puros que estão no estado radiante.
Se mostrarmos que as propriedades químicas seguem a mesma ordem de progressão decrescente, à medida que se sobe na escala das famílias químicas, dizendo de ou­tro modo, se fizermos ver que pode supor-se que não existe senão uma só matéria, da qual derivam todos os corpos que conhecemos, por transformações sucessivas, esta­remos bem perto de tocar o fluido universal de que nos falam os Espíritos. Vejamos se a unidade de matéria é uma ideia aceitável.
O sábio químico Wurtz escreveu na Teoria Atômica: A ideia da unidade de matéria é renovada, proveniente de Descartes, porquanto é uma verdade que, quando se trata do eterno e insolúvel problema da matéria, o espírito humano parece girar dentro de um círculo, perpetuando-se as mesmas ideias através dos tempos e apresentando-se sob formas rejuvenescidas às inteligências de elite que têm procurado sondar este problema.
Mas não existe uma certa diferença na maneira de operar desses grandes espíritos? Sem dúvida alguma. Uns, mais vigorosos talvez, mas mais aventureiros procederam por intuição; outros, melhor armados e mais severos, por indução racional. Aí está a superioridade dos métodos modernos, e seria injusto pretender que os esforços consi­deráveis, de que temos sido as testemunhas comovidas, não tenham impelido mais para frente o espírito humano no problema árduo de que se trata, como não o puderam fazer um Luciécio e um Descartes.
     Muitos sábios modernos foram levados, por suas pes­quisas, à conclusão de que se deve admitir a unidade da matéria. Examinando, com efeito, as relações que exis­tem entre as diferentes famílias químicas dos corpos, sere­mos obrigados a aplicar-lhes, por analogia, as mesmas leis transformistas das famílias naturais dos animais. É que temos, em nossa época, uma invencível tendência para a síntese e para a simplificação. Tanto quanto os antigos multiplicavam as causas nós temos hoje o cuidado de eliminá-las.  Mas não basta supor, é preciso ter provas.
     Uma das mais fortes que se podem fornecer é a que se chama, em química, estados alotrópicos. Certas substancia podem ter propriedades inteiramente diferentes, sem mudar de natureza quimicamente falando. Assim, o fósforo pode apresentar aspecto vermelho, branco ou preto, conforme a maneira de prepará-lo. O que há de mais notável é que o fósforo vermelho e o fósforo ordinário apresentam tais diferenças, que seríamos tentados a considerá-los dis­tintos; analisados, entretanto, pelos mais precisos méto­dos, não apresentam diferença alguma: são sempre fósforo.
A transformação se opera expondo-se no vazio barométrico o fósforo branco à ação dos raios do Sol; cremos que nenhum caso melhor demonstraria que as propriedades dos corpos são devidas apenas ao arranjo dos átomos que os estruturam.
     O ozônio é também uma modificação alotrópica do oxigênio. O carbono mostra tão múltiplos aspectos, pro­priedades tão diferentes nos alotrópicos que forma, que só é reconhecido pela sua infusibilidade e pela propriedade de produzir ácido carbônico, queimando no oxigênio. Ele se apresenta, a princípio, cristalizado, é o diamante; depois sob a forma de grafite, antracite, coque, pó de sapato, carvão... Todos esses corpos têm composição idêntica, mas apresentam propriedades diferentes, segundo o modo de reunião de seus átomos. Somos, pois, induzidos a crer que só existe uma única matéria, revestindo, entretanto, aspectos diferentes. Eis uma observação que demonstra estarmos com a verdade.
     Tratando da análise espectral, Zoborowski refere as seguintes experiências: Com o fim de determinar as tempe­raturas das diversas partes do Sol, tomaram-se fotografias dos espectros dessas diferentes partes. Cada corpo em combustão assinala, como se sabe, sua presença, na luz decomposta em seus elementos ou espectral, por raias par­ticulares. Demonstrou-se que o alargamento das raias da platina é correlativo à elevação da temperatura. Foi, assim, possível tirarem-se, com proveito, fotografias dos espectros de grande número de estrelas. E, de conformi­dade com a hipótese de Laplace, verificou-se que estes astros estão em diferentes estados de condensação. As estrelas brancas, mais ardentes, contêm hidrogênio em abundância e em alta pressão; as estrelas brilhantes se aproximam da constituição do nosso Sol; as estrelas aver­melhadas são muito menos quentes. Apagando-se, passam ao estado dos planetas obscuros. Nasceram das nebulosas. É pelo menos a grande hipótese clássica desde Laplace. Esta hipótese, porém, só será verificável porque a fotogra­fia, permitindo que se apanhem e conservem as imagens das nebulosas em diversas épocas, através dos séculos, dar-nos-á os meios de seguir as transformações destas matérias cósmicas, espécie de protoplasma que gera os mundos.
     Com um fim um pouco diferente Lockyer (1879) e Huggins (1882) fotografaram os espectros de uma série de nebulosas, das mais densas às mais rarefeitas; chegaram a reconhecer que o número dos corpos simples diminui à medida que se passa das primeiras às segundas. Os espec­tros fotográficos dos mais rarefeitos só revelam hidrogênio e fósforo.
É verdadeiramente a confirmação das vistas expostas mais acima sobre a unidade da matéria. A correlação assi­nalada por Faraday, entre o estado cada vez mais rarefeito da matéria e a perda conexa das principais propriedades que a caracterizavam, dá-nos o direito de dizer que existe um estado radiante da matéria que forma o fluido universal. É desse meio que é tirado o perispírito.
Isto posto, procuremos ver o que se passa numa mate­rialização. Para tal é preciso bem saber o que é a própria matéria e a que agente são devidas suas propriedades.
Todos os corpos são compostos de partes infinita­mente pequenas, chamadas átomos; para se ter uma ideia de sua tenuidade, tomemos uma substância corante  e constataremos que ela pode tingir vários milhões de vezes seu volume de água, isto é, que as molé­culas que constituem este corpo, se espalharam na massa total do líquido, dividindo-se cada vez mais. Em vista disso poder-se-ia crer que os corpos são indefinidamente divisíveis, o que seria um erro, porque a lei das proporções definidas é um argumento sem réplica que se pode invocar em favor de uma divisibilidade limitada. Estes átomos que estruturam todos os corpos não se tocam; são coloca­dos uns ao lado dos outros, e agrupados por uma força chamada coesão; todos os corpos da natureza nos apare­cem, pois, como coleções de átomos ou de moléculas reuni­das diversamente, daí tenderem as novas concepções científicas a considerar os fenômenos como movimentos mole­culares ou de transporte no espaço.
A matéria é inerte, incapaz de por si mesma entrar em movimento; quando se verifica um deslocamento num corpo, houve uma força que o fez sair do estado de inércia. Pode-se dizer, portanto, que o movimento é a expressão da força, mas esta força pode agir de diferentes maneiras, quer deslocando o corpo no espaço, quer determinando mudanças em seu estado molecular. Por exemplo, se com o dedo mantém-se uma corda de violino afastada da sua posição de repouso, as moléculas que formam esta corda tendem a retomar sua primeira posição, exercem uma pres­são sobre o dedo, há, pois, trabalho molecular interno; se, ao contrário, retira-se o dedo, a corda põe-se em movi­mento e o trabalho molecular que produzia a pressão se converte em movimentos de transporte que se executam de um lado e de outro da posição de repouso da corda; o vaivém se amortece progressivamente pela resistência do ar e dos pontos pelos quais as cordas se prendem ao violino.
Esta teoria estabelece, em princípio, que as qualidades dos corpos são devidas aos movimentos particulares de que são animados os átomos ou as moléculas de cada substância. As propriedades químicas seriam devidas a agrupamentos diferentes de átomos; sem dúvida não se pode supor atualmente a que espécie de movimentos cons­titutivos é devida, por exemplo, a diferença entre o ouro e a prata, mas a ideia de que é nestes movimentos que ela reside, nem por isso é hoje menos universalmente aceita.
     Não se apregoe que esta teoria seja forjada para as necessidades de nossa causa; depois do descobrimento da transformação e da conservação da força, é a única que se pode compreender, e se a encontrará exposta na psicofísica do professor Delboeuf.
     Se esta concepção moderna é verdadeira, o Universo apareceria à nossa inteligência, suposta perfeita, como sen­do composto de grupos diferentes de átomos, grupos moveis no espaço, enquanto todos os átomos oscilam em torno de um centro de equilíbrio; as variedades proviriam de agrupamentos diferentes, ou do sentido da amplidão e da rapidez das vibrações dos átomos.
     Tudo é movimento. Do átomo invisível ao corpo ce­leste perdido no espaço, tudo é submetido ao movimento, tudo gravita em uma órbita imensa ou infinitamente peque­na. Mantidas a uma distância definida, umas das outras, em razão mesma do movimento que as anima, as moléculas apresentam relações constantes que só perdem pela aquisi­ção ou subtração de certa quantidade de movimento. Se­gundo a rapidez das vibrações dos átomos as substâncias serão em estado sólido, líquido, gasoso ou radiante.
     Para fazer um corpo passar por esses diferentes esta­dos, empregamos com maior frequência o calor, que não é senão um estado vibratório do éter, mas não sabemos se outros agentes têm o mesmo poder, isto é, não podem fazer passar as diferentes substâncias pelos estados sólido, líquido e gasoso.
     Os Espíritos nos ensinaram que a vontade é uma força considerável, por meio da qual eles agem sobre os fluidos; é pois,  a vontade que determina as combinações dos flui­dos; eles podem, por sua ação, fazer todas as manipulações fluídicas que lhes aprouver, mas para materializar essas criações fluídicas eles têm necessidade de um agente essen­cial: o fluido vital. Só o encontram, capaz de preencher as condições necessárias para a materialização, no organis­mo humano, donde a presença indispensável de um mé­dium.
Conhecido isto, como conceber que um Espírito possa primeiro mostrar-se-nos e, em seguida, materializar-se?
Para que o Espírito se mostre é preciso que ele extraia o fluido vital do organismo do encamado. Por meio desse agente,   ele produz em seu envoltório uma alteração mole­cular que de translúcido o torna opaco. Encontra-se um efeito análogo, posto que inverso, quando se estudam as propriedades de certas substâncias, como o hidrofânio, rocha silicosa opaca,  que se torna transparente, quando mergulhada na água. Dá-se o mesmo com uma folha de papel untada dum corpo gorduroso. A opacidade é devida à reflexão da luz sobre as diferentes parcelas do papel; mas a interposição de uma substância que impeça a refle­xão, permite a luz atravessar o corpo e, por consequência, produz-se a transparência.
     Efeito inverso se nota com os Espíritos. Aliás, basta examinar a condensação de um vapor num tubo, para com­preender-se como pode o perispírito, sob a influência da vontade e do fluido vital, materializar-se.
     O invólucro fluídico que reproduz, geralmente, a apa­rência física que o Espírito tinha em sua última encarnação, possui todos os órgãos do homem, de sorte que, diminuindo o movimento molecular radiante desse invólucro, ele apare­ce,  a princípio, sob um aspecto vaporoso, como no caso da inspetora de Riga; depois o fluido vital do médium se vai acumulando no corpo fluídico, e lhe comunica, momentaneamente, uma vida fictícia, que é tanto mais intensa quando maior quantidade de fluido despende o médium. É esta a razão por que os médiuns de materiali­zação ficam mergulhados em catalepsia.
     Pôde-se observar, nos casos narrados de desdobra­mento, que não parecia necessária à presença de um mé­dium. É que o próprio encamado fornecia o fluido vital indispensável, ele era seu próprio médium, e seu duplo tinha uma realidade mais ou menos tangível, conforme a sua abundância de fluidos.
     Circunstância que parece estranha é a desaparição súbita do espírito materializado. Dir-se-ia que o perispírito, que se materializou lentamente, deve repassar por fases inversas para voltar ao estado fluídico. Isto, porém, se compreende, sabendo-se que a água, mesmo em estado sólido, tem certa tensão de vapor. Não é raro ver-se o gelo desaparecer, sem ter passado pela fusão; ele passa bruscamente ao estado de vapor, e, neste caso, devemos admitir, o que já reconhecia  o naturalista Plínio, que houve vaporização imediata.
     Este fenômeno foi estudado por Gay Lussac e Reg­nault, que operaram até 52° abaixo de zero. Certos corpos sólidos, como o iodo e a cânfora, passam também direta­mente ao estado gasoso. É fácil compreender que se produz algo semelhante na desaparição súbita de um espírito mate­rializado.
     Para que nossa demonstração fosse completa, seria preciso que se pudessem fazer experiências que estabele­cessem a subministração do fluido vital ao organismo do Espírito. Nada ainda foi tentado com este objetivo e é difícil, em vista do pouco tempo em que estes fenômenos são estudados cientificamente, determinando-lhes todas as leis. Mas seja como for, acreditamos que nossa teoria pode ser aceita para explicar os fatos, e seremos muito felizes se estes dados puderem servir ao esclarecimento destas questões, ainda tão pouco conhecidas.
     Não temos a pretensão de impor nossa convicção a quem quer que seja; contentamo-nos em trazer nossa pedra ao grande edifício científico que se erguerá dentro em pouco, e que terá por base esses estados fluídicos, hoje tão pouco estudados.
Essa maneira de encarar o perispírito, permitir-nos-á compreender mais facilmente o papel que ele goza durante a vida do Espírito. Vamos resumir, segundo Allan Kardec, o que sabemos sobre o assunto.


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